quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Reflexões de um agnóstico sincero...

O texto abaixo foi extraído do meu mural no Facebook. Em resposta a um "amigo virtual" que sugeriu algo com que não concordo: que o agnóstico (ele generalizou) é um angustiado. Respondi de "uma canetada só". Sendo bem sincero, não querendo ofender ninguém. Apenas suplicando algo: que as pessoas não vejam as outras como se estivessem diante de um espelho. Claro que eu me senti no direito de tecer comentários acerca da cultura religiosa dele. Quem fala, tem que estar preparado para ouvir. Não estou generalizando. Apenas me dirijo a pessoas que não conseguem entender que existem outras que são normais, mesmo pensando de forma diverente.

Eis:

Sou agnóstico, vim de um lar adventista de tradição (com eu + dois irmãos formados em Teologia no SALT/IAE). Para ser sincero não tenho angústia não.

Acabou a desconfiança que eu sempre tive: será que nasci, como loteria, no lugar certo? Ou será que Deus gosta tanto de mim que me colocou no lugar certo enquanto bilhões não estão?

Sabe por que você não experimentou outra religião? Porque nasceu no contexto cristão.

Caso tivesse nascido e criado num outro contexto é bem provável que considerasse o cristianismo sem sentido, assim como muitos cristãos consideram as demais religiões sem sentido.

Não conheço uma pessoa que seja religiosa de verdade. Que tenha desbravado o mundo da fé, conhecido todas por inteiro e depois escolhido uma.

Você é fruto único do contexto cristão. Não é um religioso. É uma pessoa com uma cultura religiosa cristã muito forte. Também fui assim, mas tive coragem de dar um passo à frente...

Jesus é para você o ser que lhe colocaram na frente e ensinaram a enxergar. Fosse Buda, você seria um budista com argumentos poderosos ...

Tenho certeza que se você percorrer, com coragem e honestidade, o caminho que eu percorri, seus conceitos serão outros.

Faz tempo que deixei de considerar como válida a opinião das pessoas que só possuem uma versão de algum contexto filosófico, teológico, evolucionista...

Isso vale para teísta e ateísta.

Não pense que quero ser ofensivo. Estou apenas sendo sincero. Disse tudo isso para mim mesmo pois vi que meu ponto de vista era sofrível. Não passava de um samba de uma nota só.

Nem adianta dizer que a visão que você tem é diferente, especial, iluminada, única, mágica e oriunda da "verdade verdadeira"...

Já pensei assim também. Eu me considerava um grande felizardo, estudioso primoroso, nota A em Grego, Hebraico, Latim, Teologia Sistemática e quetais. (orava muito, vivia à luz da Justificação pela Fé). Nem adianta dizer que "não experimentei de verdade". Já ouvi isso demais. Inclusive de pessoas que hoje pensam como eu (antes não pensavam, deram um passo à frente e mudaram).

AFIRMO, POIS VIVI ISSO: todos os que percorreram o caminho que percorri mudaram de opinião. Não mudaram de caráter. Não apostataram. Apenas enxergaram o que saltava aos olhos, mas que era obliterado pela visão obtusa e única.

Tudo o que aprendi era dirigido. Mostraram para mim apenas o que era interessante para que eu ficasse no mesmo lugar e acreditasse que vivia sob a luz e com pena dos coitados que não enxergavam a luz que para mim era tão clara.

Um dia eu parei e pensei: não sou robô. Penso por mim mesmo. Vou verificar. Vou reestudar o cristianismo, vou reestudar o VT, as religiões hebraicas. O judaísmo que é bem mais antigo que o cristianismo. Quero saber o que pensam os orientais.

Descobri que não sou nada. Minha luz não é maior do que a de ninguém. Que não existe igreja exclusiva. Líder exclusivo. Que sou cristão porque nasci no Brasil. Poderia ser qualquer coisa, caso tivesse nascido em qualquer outro lugar.

Não é difícil enxergar o óbvio. O difícil é ter coragem para aceitar a realidade...

Sou apenas um agnóstico, que não se enfia em teses insustentáveis (teístas ou ateístas).

Não sinta pena de mim, por não ver tão "claramente" como você. Isso me obrigaria a sentir piedade de você, por não ter percorrido o maravilhoso e ao mesmo tempo doloroso e real caminho que trilhei...

Humildemente: apenas isso...

Enéias Teles Borges

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Sobre o DÍZIMO e sobre o TRIBUTO

Dízimo não é por imposição, a não ser para quem o enxergue pelos olhos da religiosidade (fé). Acredito que separar algo do que se ganha para ajudar quem mereça e precisa faz bem (inclusive) ao próprio doador.

No que tange à questão tributária: é imposição pura. O que se deve pensar, enquanto cristão, é o seguinte: Deus e César. Conheço pessoas que defendem a devolução do dízimo e são sonegadores de carteirinha. Ou faz 100% do que Cristo ensinou ou não faz nada... Não adianta devolver o dízimo e oferecer outros bens se não devolver o que se deve ao Governo. Notem que Cristo não questionou se era certo ou errado o que César cobrava...

É claro que para ficar em dia com César, Cristo operou um milagre não foi? Sabem que isso me intriga bastante? Sempre pensei que não me oporia a pagar 100% do que o Governo tributa, desde que fosse possível conseguir o recurso de forma milagrosa.

Qual a lição que podemos tirar disso tudo?

Enéias Teles Borges

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Cristãos x Não Cristãos...

Relevância inda que tardia 

O Barna Institute (www.barna.org) é uma espécie de DataFolha cristão, um instituto de pesquisa voltado exclusivamente para o mundo cristão na América do Norte. Graças a seu trabalho e ao de outras iniciativas, temos uma visão bastante reveladora do estado atual da sociedade, especialmente norteamericana. Bem, nosso desejo, confessado ou não, é sermos tal qual os EUA, assim, mesmo que alguns dos tópicos a seguir (retirados de Discipleshift, de Putman, Harrington e Coleman) não sejam realidade aqui nos trópicos (duvido que sejam muitos), talvez seja interessante conhecer essas pesquisas para refletirmos se é realmente isso que queremos nos esforçar para ser. 

Os índices de incidência dos seguintes fatores são idênticos entre cristãos e não cristãos: 

  * Divórcios;
  * Consumo de pornografia entre homens (e esse índice não é pequeno);
  * Violência doméstica;
  * Abuso de drogas e álcool.
  * Cristãos são duas vezes mais racistas que não cristãos (tá aí o pastor Feliciano que não nos deixa mentir).
  * Um em cada quatro casais não casados vivendo juntos identificam-se como evangélicos.
  * 6% dos evangélicos dizimam;
  * 50% das pessoas que afirmam ir ao templo da igreja regularmente realmente vão.
  * 60 a 80% dos jovens nascidos em lares cristãos deixarão a igreja na casa dos 20 anos.
  * Menos de 1 a cada 5 pessoas que se declaram cristãos convertidos compreendem as crenças bíblicas mais basilares.
  * A maioria dos que se dizem cristãos acreditam que a Bíblia está cheia de erros e não acreditam em doutrinas como a vida sem pecado de Jesus. Acreditam, por outro lado, que se forem boas pessoas vão para o Céu.


James Emery White (em Rethinking the church) argumenta que há 40 anos, as pessoas que não frequentavam uma igreja nos EUA, de uma forma geral, pelo menos conheciam elementos basilares da fé cristã, tinham as igrejas e seus líderes em alta conta e acreditavam na existência de Deus. Hoje a coisa é bem diferente. As pessoas têm uma visão muito negativa de igrejas e de seus líderes, não acreditam em Deus e teriam dificuldades para reconhecer Jesus entre retratos de outras figuras históricas. 

Aparentemente, o desafio para a igreja de levar o evangelho do reino ao mundo todo em testemunho a todas as gentes (Mateus 24:14) está mais difícil, não menos, a despeito dos avanços em meios de comunicação. Algumas comunidades têm feito esforços imensos para se manter relevantes num contexto pós moderno, mas a verdade é que se isso não representar uma semelhança maior de seus membros com Jesus Cristo, toda mudança de forma será em vão. E essa semelhança deve ser mostrada na vida privada, no ambiente de trabalho, nas áreas comuns do condomínio. Não na igreja. É preciso que as estatísticas mostrem que há uma diferença real entre cristãos e não cristãos, uma diferença que não tem nada a ver com a roupa que vestem ou a música que ouvem. Uma diferença que vem da adoção da escala de valores de seu Mestre, Jesus Cristo. Essa é a diferença capaz de impactar e mostrar relevância em pleno século XXI.

É preciso, portanto, que comunidades cristãs se esforcem para conhecer Jesus e para ser como Ele. Alguém sem medo de interagir com pessoas feridas, Alguém que não queira estar perto de pessoas espiritualmente doentes, Alguém que abrace e acolha antes que a mudança de comportamento aconteça e para que a mudança de comportamento aconteça. 

domingo, 12 de maio de 2013

A maior certeza da vida... é a morte...

Um dia, num contexto de igreja, uma pessoa disse que a maior certeza da vida era que a morte viria para todos. Outra esbravejou dizendo que Jesus poderia voltar a qualquer momento é que tal afirmativa seria falsa. 

Como discutir aquilo que vem acontecendo há milênios (a morte) com alguém que usa a fé como argumento técnico?

Melhor seria jamais conversar sobre tal tema com determinadas pessoas.

Ocorre que olhando em volta eu me pergunto: existe com quem conversar de forma racional? Isso me causa um sofrimento sem medida. Por isso eu me sinto, quanto ao tema, o mais isolado dos homens...

Enéias Teles Borges

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Dos milagres

O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo...
Nem mudar água pura em vinho tinto...
Milagre é acreditarem nisso tudo!

(Mario Quintana)

terça-feira, 30 de abril de 2013

Por que o Deus Cristão é Impossível

Chad Docterman

Introdução

Os cristãos consideram que a existência de seu Deus é uma verdade óbvia. Esta assunção é falsa, não apenas porque falta qualquer evidência para a existência deste Deus — que, apesar de onipresente, é invisível —, mas porque a própria natureza que os cristãos atribuem a este Deus é autocontraditória.

Provando uma negativa universal

Muitos cristãos, assim como muitos ateus, alegam que é impossível provar uma negativa universal. Por exemplo, apesar de não haver evidências de que unicórnios ou dragões existem, não podemos provar sua inexistência. A não ser que tenhamos um conhecimento completo do Universo, precisamos a admitir a possibilidade de que, em algum lugar do Universo, talvez existam tais seres.

Mas a alegação de que a onisciência é necessária para provar uma negativa universal presume que o conceito que estamos discutindo é logicamente coerente. Se os atributos que conferimos a um objeto ou ser hipotéticos são autocontraditórios, então podemos concluir que este não pode existir e, portanto, não existe. Não é necessário todo o conhecimento do universo para provar que esferas cúbicas não existem.

Tais objetos têm atributos mutuamente exclusivos que tornam sua existência impossível. Um cubo, por definição, tem oito vértices, enquanto a esfera não tem nenhum. Tais propriedades são completamente incompatíveis — não podem estar contidas simultaneamente no mesmo objeto.

Pretendo demonstrar que as supostas propriedades do Deus cristão Iavé, assim como as de uma esfera cúbica, são incompatíveis, e, ao fazê-lo, demonstrar que a existência de Iavé é impossível.

Definindo Iavé

Os cristãos dotaram seu Deus de todos os seguintes atributos: ele é eterno, todo-poderoso e criou todas as coisas; criou todas as leis da natureza e pode mudar qualquer coisa por meio de um ato de sua vontade; é todo-bondade, todo-amor e perfeitamente justo; é um Deus pessoal que experimenta todas as emoções de um ser humano; é todo-sabedoria; vê todo o passado e todo o futuro.

A criação de Deus era originalmente perfeita, mas, os humanos, ao desobedecê-lo, trouxeram a imperfeição ao mundo. Humanos são maus e pecadores, e precisam sofrer neste mundo devido à sua pecaminosidade.

Deus dá aos humanos a oportunidade de aceitar o perdão de seu pecado, e todos que o fizerem serão recompensados com a bem-aventurança no céu, mas, enquanto estiverem na Terra, devem sofrer por sua causa. Todos os humanos que decidirem não aceitar este perdão serão enviados ao inferno para sofrer o tormento eterno.

Tais atributos de Deus são relatados pela Bíblia, que os cristãos acreditam ser a palavra perfeita e verdadeira de Deus.

Um verso que muitos cristãos gostam de citar diz que ateus são tolos (Cf. Salmos 14:1). Pretendo demonstrar que os conceitos divinos mencionados acima são completamente incompatíveis, e revelar a impossibilidade de todos eles co-existirem simultaneamente no mesmo ser. Não há qualquer tolice em negar o impossível; tolice é adorar um Deus impossível.

A perfeição busca ainda mais perfeição

O que Deus fez durante aquela eternidade anterior à criação de todas as coisas? Se Deus era tudo que existia naquele tempo, o que perturbou o equilíbrio eterno e o induziu à criação? Estava entediado? Estava solitário?

Deus supostamente é perfeito. Se algo é perfeito, este algo é completo — não precisa de qualquer outra coisa. Nós, humanos, nos engajamos em atividades porque estamos buscando uma perfeição elusiva, pois há um desequilíbrio causado pela diferença entre o que somos e o que queremos ser. Se Deus é perfeito, então não pode haver desequilíbrio. Não há qualquer coisa de que ele necessite, qualquer coisa que deseje ou qualquer coisa que deva ou irá fazer. Um Deus que é perfeito não faz qualquer coisa senão existir. Um criador perfeito é impossível.

A perfeição gera imperfeição

Entretanto, por mero exercício intelectual, continuemos. Suponhamos que este Deus perfeito tenha realmente criado o Universo. Os humanos foram a coroa de sua criação, visto que foram criados à sua imagem e têm a habilidade da tomar decisões. Entretanto, esses humanos destruíram a perfeição original escolhendo desobedecer a Deus. 

Como!? Se algo é perfeito, nada imperfeito pode vir dele. Uma vez alguém disse que um mau fruto não pode vir de uma boa árvore; entretanto, este Deus “perfeito” criou um Universo “perfeito” que foi tornado imperfeito pelos humanos “perfeitos”.

A fonte última da imperfeição é Deus. O que é perfeito não pode fazer-se imperfeito, assim, os humanos devem ter sido criados imperfeitos. Tudo que é perfeito não pode criar coisas imperfeitas, então Deus deve ser imperfeito para ter criado seres humanos imperfeitos. Um Deus perfeito que cria seres humanos imperfeitos é impossível.

O argumento do livre-arbítrio

A objeção dos cristãos a este argumento envolve o livre-arbítrio. Eles dizem que um ser precisa possuir livre-arbítrio para ser feliz. O Deus todo-bondade não queria criar robôs, então deu aos humanos o livre-arbítrio para possibilitar a eles experimentar o amor e a felicidade. Mas os humanos usaram este livre-arbítrio para escolher o mal, e introduziram a imperfeição ao Universo originalmente perfeito de Deus. Deus não tinha controle sobre esta decisão, assim a culpa por nosso Universo imperfeito é dos humanos, não de Deus.

Há vários motivos pelos quais este argumento é fraco. Em primeiro lugar, se Deus é onipotente, então a assunção de que o livre-arbítrio é necessário para a felicidade é falsa. Se Deus pôde fazer a regra de que apenas seres com livre-arbítrio poderiam experimentar a felicidade, então poderia, tão facilmente quanto, ter feito a regra de que apenas robôs poderiam experimentar a felicidade. A última opção é claramente superior, visto que robôs perfeitos nunca poderiam tomar decisões que tornassem eles ou seu criador infelizes, enquanto seres com livre-arbítrio poderiam. Um Deus perfeito e onipotente que cria seres capazes de arruinar sua própria felicidade é impossível.

Em segundo lugar, mesmo se admitirmos a necessidade do livre-arbítrio para a felicidade, Deus poderia ter criado humanos com livre-arbítrio que não tivessem a habilidade de escolher o mal, mas apenas entre várias opções boas.

Em terceiro lugar, Deus supostamente possui livre-arbítrio, e mesmo assim ele não toma decisões imperfeitas. Se humanos são imagens miniaturizadas de Deus, nossas decisões deveriam ser similarmente perfeitas. Ademais, os ocupantes do céu, que presumivelmente precisam possuir livre-arbítrio para serem felizes, nunca usarão este livre-arbítrio para tomar decisões imperfeitas. Por que os humanos originalmente perfeitos fariam diferente?

O problema continua: a presença de imperfeição no Universo refuta a suposta perfeição de seu criador.

O Deus todo-bondade cria sofrimento futuro premeditado

Deus é onisciente. Quando criou o Universo, viu os sofrimentos que humanos suportariam como resultado do pecado daqueles humanos originais. Ele ouviu os gritos dos condenados. Certamente ele sabia que seria melhor para esses seres humanos que nunca tivessem nascido — e a Bíblia, de fato, diz exatamente isso —, e certamente esta divindade toda-compaixão teria antevisto a criação de um Universo destinado à perfeição no qual muitos dos humanos estavam condenados ao sofrimento eterno. Um Deus perfeitamente compassivo que deliberadamente cria seres condenados ao sofrimento é impossível.

Punição infinita por pecados finitos

Deus é perfeitamente justo, e ainda assim sentencia os imperfeitos humanos que criou ao sofrimento infinito no inferno por pecados finitos. Claramente, uma ofensa limitada não justifica uma punição ilimitada. A sentenciação divina dos seres humanos imperfeitos a uma eternidade no inferno por um pecado com a duração de uma mera vida mortal é infinitamente injusta. O caráter absurdo desta punição infinita mostra-se ainda maior quando consideramos que a fonte última da imperfeição humana é o Deus que os criou. Um Deus perfeitamente justo que sentencia sua criação imperfeita à punição infinita por pecados finitos é impossível.

Crença mais importante que ação

Consideremos todas as pessoas que vivem em regiões remotas do mundo e que jamais ouviram o “evangelho” de Jesus Cristo. Consideremos as pessoas que aderiram naturalmente à religião de seus pais e nação — como foram ensinados a fazer desde seu nascimento. Se acreditarmos no que os cristãos dizem, todas essas pessoas irão perecer no fogo eterno por não acreditarem em Jesus. Não importa quão justos, bondosos e generosos eles foram com seus semelhantes durante sua vida: se não aceitarem o evangelho de Jesus, estão condenados. Nenhum Deus justo jamais julgaria um homem por suas crenças em vez de suas ações.

Revelação imperfeita da perfeição

A Bíblia supostamente é a palavra perfeita de Deus. Ela contém instruções para que a humanidade evite as eternas chamas do inferno. Quão maravilhoso e bondoso da parte deste Deus é proporcionar a nós meios de superar os problemas pelos quais ele, em última instância, é responsável! O Deus todo-poderoso poderia, por um simples ato de sua vontade, eliminar todos os problemas que nós, humanos, precisamos enfrentar; mas, em vez disso, com sua sabedoria infinita, ele optou por oferecer este indecifrável amálgama de livros denominado Bíblia como meio para evitaremos o inferno que ele preparou para nós. O Deus perfeito decidiu revelar sua vontade através desta obra imperfeita, escrita na linguagem imperfeita dos humanos imperfeitos, traduzida, copiada, interpretada e narrada por homens imperfeitos. Dois homens nunca irão concordar sobre o que a palavra de Deus realmente significa, visto que grande parte dela é autocontraditória ou obscurecida por enigmas. E ainda assim o Deus perfeito espera que nós, imperfeitos humanos, entendamos este enigma paradoxal utilizando as mentes imperfeitas com as quais ele nos equipou.

Certamente o Deus todo-sabedoria e todo-poderoso sabia que teria sido melhor revelar sua vontade perfeita diretamente a cada um de nós em vez de permitir ela fosse distorcida e pervertida pela imperfeita linguagem e pelas ruinosas interpretações do homem.

Justiça contraditória

Não se precisa olhar em qualquer lugar senão própria na Bíblia para descobrir suas imperfeições, pois ela se contradiz, e assim expõe sua própria imperfeição. Ela se contradiz em questões de justiça, pois o mesmo Deus que assegura seu povo de que os filhos não serão punidos pelos pecados de seus pais acaba por destruir uma família inteira pelo pecado de um homem (ele havia roubado um pouco do saqueio de guerra de Iavé). Foi o mesmo Iavé que afligiu milhares de inocentes com praga e morte para punir o maldoso rei Davi por tomar um censo. Foi o mesmo Iavé que permitiu que humanos matassem seu filho porque o perfeito Iavé tinha fracassado em sua própria criação. Consideremos quantos foram apedrejados, queimados, assassinados, estuprados e escravizados devido ao distorcido senso de justiça de Iavé. O sangue de bebês inocentes está nas mãos perfeitas, justas e compassivas de Iavé.

História contraditória

A Bíblia contradiz-se em questões históricas. Uma pessoa que lê e compara os conteúdos da Bíblia ficará confuso sobre quem eram exatamente as esposas de Esaú, se Timná era uma concubina ou um filho e se a linhagem terrena de Jesus vem de Salomão ou de seu irmão Natã. Há centenas de contradições históricas documentadas. Se a Bíblia não pode confirmar a si própria em questões mundanas, como poderemos confiá-la em questões morais e espirituais?

Profecias falhadas

A Bíblia interpreta mal suas próprias profecias. Compare-se Isaías 7 com Mateus 1 para se encontrar apenas uma das muitas profecias mal interpretadas das quais os cristãos são passivamente ou deliberadamente ignorantes. O sinal dado por Isaías ao rei Ahaz visava assegurá-lo de que seus inimigos, Rei Rezim e Rei Remalia, seriam derrotados. Essa profecia foi cumprida exatamente no capítulo seguinte. Ainda assim, Mateus 1 não apenas interpreta erradamente a palavra “donzela” como “virgem”, mas também alega que esta profecia já cumprida na realidade cumpriu-se com o nascimento virginal de Jesus!

O cumprimento de profecias na Bíblia é citado como prova de sua inspiração divina, entretanto, aqui está um bom exemplo de uma profecia cujo significado original foi e continua sendo distorcido para sustentar doutrinas absurdas e falsas. Não há limites para o que um indivíduo crédulo fará para sustentar suas crenças febris quando confrontado com evidências contundentes.

A Bíblia é imperfeita. Apenas uma imperfeição é necessária para destruir a suposta perfeição da palavra de Deus. Muitas foram encontradas. Um Deus perfeito que revela sua vontade perfeita através de um livro imperfeito é impossível.

O onisciente altera o futuro

Um Deus que conhece o futuro é impotente para mudá-lo. Um Deus onisciente que é todo-poderoso e dotado de livre-arbítrio é impossível.

O onisciente é surpreendido

Um Deus que sabe tudo não pode ter emoções. A Bíblia diz que Deus experimenta todas as emoções humanas, incluindo ódio, tristeza e felicidade. Nós, humanos, experimentamos emoções como resultado de um novo conhecimento. Um homem que desconhece a infidelidade de sua esposa irá experimentar as emoções de ódio e tristeza apenas após descobrir o que anteriormente, para ele, estava oculto. Em contraste, o Deus onisciente não é ignorante em relação a qualquer coisa. Nada é oculto para ele, nada novo pode lhe ser revelado — assim não há como adquirir um conhecimento ao qual possa reagir emocionalmente.

Nós, humanos, experimentamos ódio e frustração quando algo está errado e somos impotentes para consertá-lo. O Deus perfeito e onipotente pode, entretanto, consertar qualquer coisa. Humanos sentem desejo daquilo que lhes falta. Para o Deus perfeito nada falta. Um Deus onisciente, onipotente e perfeito que experimenta emoções é impossível. 

Conclusão 

Ofereci argumentos para a impossibilidade — e, portanto, para a inexistência — do Deus cristão Iavé. Nenhum indivíduo racional e livre-pensador pode aceitar a existência de um ser cuja natureza é tão contraditória quanto a de Iavé, o “perfeito” criador de nosso imperfeito Universo. A existência de Iavé é tão impossível quanto a existência de esferas cúbicas ou unicórnios róseos invisíveis.

Apesar de que crentes podem encontrar conforto em serem fiéis a impossibilidades, não há maior satisfação que a de possuir uma mente lúcida. Eles podem escolher servir um Deus impossível. Eu escolho a realidade.
  • autor: Chad Docterman
  • tradução: André Cancian
(Ateus.Net)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Trecho do livro: Deus, a Liberdade e o Mal

Eis um pequeno trecho, contido na página 45, do livro "Deus, a Liberdade e o Mal" de Alvin Plantinga, da Editora Vida Nova (Edição de 2012):

(...)

Nem uma defesa nem uma teodiceia, é claro, nos dão qualquer pista quanto à razão de Deus para um mal especifico - a morte ou o sofrimento de uma pessoa que nos é próxima, por exemplo. E há ainda outra função nas imediações - uma espécie de função pastoral - a que nenhuma delas responde. Quando é confrontado com o mal na sua própria vida ou quando subitamente se dá conta da extensão e magnitude do mal, um crente em Deus pode passar por uma crise de fé. Pode sentir-se tentado a seguir os conselhos dos "amigos" de Jó; pode sentir-se tentado a "amaldiçoar a Deus e morrer". Nem uma defesa do livre-arbítrio nem uma teodiceia do livre-arbítrio foram concebidas para ser de grande ajuda ou servir de consolo a quem passa por tal tempestade na alma (ainda que num caso específico, é claro, uma ou outra possam revelar-se úteis). Nenhuma deve ser vista principalmente como um meio de aconselhamento pastoral. Provavelmente, nenhuma permitirá a alguém encontrar a paz com si mesmo e com Deus face ao mal que há no mundo. Mas é claro que nenhuma visa a esse propósito.

Nota: Fica claro, ao longo de toda a leitura (a qual sugiro), que o alvo mesmo é mostrar que argumento por argumento o criacionista também possui. Argumento para, no mínimo, equilibrar a balança da do jogo das palavras "filosóficas e afins". O livro não ajuda ao que carece de fé. É um conteúdo que mede forças argumentativas. Como se quisesse dizer: nós também sabemos argumentar...

Enéias Teles Borges

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Judeu ortodoxo se cobre com plástico em voo para evitar cemitérios

A imagem de um passageiro que se embrulhou em um saco plástico durante um voo se espalhou pela internet, após ser postada por um usuário da rede social "Reddit", identificado como “Final Say”

De acordo com o jornal “GA Daily News”, o passageiro, vestido todo de preto, seria um sacerdote Cohen, judeu ortodoxo que segue a crença de que todos são descendentes de Aarão.

Conforme a tradição, eles não podem visitar cemitérios e, como o trajeto da aeronave passa por cima de campos santos, o homem não poderia ter nenhum tipo de contato com tais locais.

Por isso, a sacola plástica funcionaria como um “invólucro”, e manteria o sacerdote puro. A foto, enviada ao serviço de hospedagem de fotos “Imgur”, foi reproduzida mais de 730 mil vezes.

Fonte: G1.

Nota: Religião tem tudo disso aí. Por mais que se tente dar uma pouco de "razão" à fé, sempre se esbarra com algum tipo de exagero.

Enéias Teles Borges

quarta-feira, 13 de março de 2013

Papa Francisco e os Alarmistas...



Os profetas de plantão (alarmistas) foram surpreendidos pelos últimos acontecimentos. Curiosamente eles não profetizaram sobre as possibilidades que pareciam ínfimas ou inexistentes. Como poderiam trabalhar com a ideia da renúncia do Papa Bento XVI e a escolha do Cardeal Argentino, atual Papa Francisco I?  As profecias feitas, depois dos falecimentos de Paulo VI e João Paulo I, não se confirmaram. As que foram feitas, logo após a morte de João Paulo II, também não. E agora, com a renúncia de Bento XVI?

Papa Negro ou Papa Norte-Americano...

Era o cenário ideal. Papa Negro e Presidente Americano Negro ou Papa Norte-Americano e Presidente Americano Negro. Em qualquer das duas situações seria possível alardear nos quatro cantos da Terra que o fim estaria próximo.

João Paulo II não ressuscitou...

Uma corrente alarmista ultrarradical trabalhava com a hipótese da “ressurreição” de João Paulo II, que milagrosamente reergueria a Igreja Católica.

Como isso não ocorreu é possível que a “profecia” seja adaptada. Como? Bento XVI, o Papa Emérito, ressuscitaria “espiritualmente”, voltando a ser o Papa. Claro que depois de algo trágico e inesperado que poderia ocorrer a Francisco I.

Podem ter certeza que tal foco alarmista surgirá nas redes sociais.

Papa Sul-Americano, Argentino...

Já é demais. O que pode se aproveitar de tal cenário? Muito pouco. Tal escolha demonstra uma preocupação da ICAR: conter o crescimento do movimento Pentecostal que ameaça estender seus tentáculos para o mundo todo.

A tão esperada perseguição (se vier a ocorrer), não será contra os protestantes conservadores. Notem que as igrejas protestantes tradicionais estão encolhendo. Para se chegar a esta conclusão é preciso fazer um cálculo óbvio. As igrejas tradicionais estão crescendo na mesma proporção do crescimento da população mundial? Claro que não...

Por outro lado o movimento Neopentecostal cresce tanto em número de membros, quanto no cálculo proporcional.

A famigerada “perseguição” seria, portanto, contra Edir Macedo, Waldemiro Santiago, RR Soares, Silas Malafaia, Estevam Hernandes, David Miranda e afins.

Além da preocupação com os crimes sexuais e crimes financeiros no Banco do Vaticano, existe a grande preocupação em conter essa onda pentecostal. 

Eles sempre acham um jeito...

Não tenham dúvidas de que os Profetas de Plantão (alarmistas) encontrarão uma justificativa. Afinal eles precisam profetizar. Está difícil “encaixar” uma teoria, tendo com ator principal um Cardeal Argentino (Jorge Mario Bergoglio).

Basta esperar para ver e ler. Alguém duvida disso? Eu não...

Enéias Teles Borges

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Leonardo Boff: A Igreja-instituição como “casta meretriz”

Quem acompanhou o noticiário dos últimos dias acerca dos escândalos dentro do Vaticano, trazidos ao conhecimento pelos jornais italianos “La Repubblica” e o “La Stampa”, referindo um relatório com trezentas páginas, elaborado por três Cardeais provectos sobre o estado da cúria vaticana deve, naturalmente, ter ficado estarrecido. Posso imaginar nossos irmãos e irmãs piedosos que, fruto de um tipo de catequese exaltatória do Papa como “o doce Cristo na Terra” devam estar sofrendo muito, pois amam o justo, o verdadeiro e o transparente e jamais quereriam ligar sua figura a notórios malfeitos de seus assistentes e cooperadores.

O conteúdo gravíssimo destes relatórios reforçaram, no meu entender, a vontade do Papa de renunciar. Ai se comprovava uma atmosfera de promiscuidade, de luta de poder entre “monsignori”, de uma rede de homossexualismo gay dentro do Vaticano e desvio de dinheiro do Banco do Vaticano. Como se não bastassem os crimes de pedofilia em tantas dioceses que desmoralizaram profundamente a instituição-Igreja.

Quem conhece um pouco a história da Igreja – e nós profissionais da área temos  que estuda-la detalhadamente- não se escandaliza. Houve épocas de verdadeiro descalabro do Pontificado com Papas adúlteros, assassinos e vendilhões. A partir do Papa Formoso (891-896) até o Papa Silvestre (999-1003) se instaurou segundo o grande historiador Card. Barônio a “era pornocrática” da alta hierarquia da Igreja. Poucos Papas escapavam de serem depostos ou assassinados. Sergio III (904-911) assassinou seus dois predecessores, o Papa Cristóvão e Leão V.

A grande reviravolta na Igreja como um todo, aconteceu, com consequências para toda a história ulterior, com o Papa Gregório VII em 1077. Para defender seus direitos e a liberdade da instituição-Igreja contra reis e príncipes que a manipulavam, publicou um documento que leva este significativo título “Dictatus Papae” que literalmente traduzido significa “a Ditadura do Papa”. Por este documento, ele assumia todos os poderes, podendo julgar a todos sem ser julgado por ninguém. O grande historiador das idéias eclesiológicas Jean-Yves Congar, dominicano, considera a maior revolução acontecida na Igreja. De uma Igreja-comunidade passou a ser uma instituição-sociedade monárquica e absolutista, organizada de forma piramidal e que vem até os dias atuais.

Efetivamente, o cânon 331 do atual Direito Canônico se liga a esta compreensão, atribuindo ao Papa poderes que, na verdade, não caberiam a nenhum mortal, senão somente a Deus: ”Em virtude de seu ofício, o Papa tem o poder ordinário, supremo, pleno, imediato, universal” e em alguns casos precisos, “infalível”.

Esse eminente teólogo, tomando a minha defesa face ao processo doutrinário movido pelo Card. Joseph Ratzinger em razão do livro “Igreja:carisma e poder” escreveu um artigo no “La Croix”(8/9/1984) sobre o “O carisma do poder central”. Ai escreve:”O carisma do poder central é não ter nenhuma dúvida. Ora, não ter nenhuma dúvida sobre si mesmo é, a um tempo, magnífico e terrível. É magnífico porque o carisma do centro consiste precisamente em permanecer firme quando tudo ao redor vacila. E é terrível porque em Roma estão homens que tem limites, limites em sua inteligência, limites em seu vocabulário, limites em suas referencias, limites no seu ângulo de visão”. E eu acrescentaria ainda limites em sua ética e moral.

Sempre se diz que a Igreja é “santa e pecadora” e deve ser “sempre reformada”. Mas não é o que ocorreu durante séculos nem após o explícito desejo do Concílio Vaticano II e do atual Papa Bento XVI. A instituição mais velha do Ocidente incorporou privilégios, hábitos, costumes políticos palacianos e principescos, de resistência e de oposição que praticamente impediu ou distorceu todas as tentativas de reforma.

Só que desta vez se chegou a um ponto de altíssima desmoralização, com práticas até criminosa que não podem mais ser negadas e que demandam mudanças fundamentais no aparelho de governo da Igreja. Caso contrário, este tipo de institucionalidade tristemente envelhecida e crepuscular definhará até entrar em ocaso. Os atuais escândalos sempre houveram na cúria vaticana apenas que não havia um providencial Vatileaks para  trazê-los a público e indignar o Papa e a maioria dos cristãos.

Meu sentimento do mundo me diz que  estas perversidades no espaço do sagrado e no centro de referencia para toda a cristandade – o Papado – (onde deveria primar a virtude e até a santidade) são consequência desta centralização absolutista do poder papal.  Ele faz de todos vassalos, submissos  e ávidos por estarem fisicamente perto do portador do supremo poder, o Papa. Um poder absoluto, por sua natureza, limita e até nega a liberdade dos outros, favorece a criação de grupos de anti-poder, capelinhas de burocratas do sagrado contra outras, pratica  largamente a simonía que é compra e venda de vantagens, promove  adulações e destrói os mecanismos da transparência. No fundo, todos desconfiam de todos. E cada qual procura a satisfação pessoal da forma que melhor pode. Por isso, sempre foi problemática a observância do celibato dentro da cúria vaticana, como se está revelando agora com a existência de uma verdadeira rede de prostituição gay.

Enquanto esse poder não se descentralizar e  não outorgar mais participação de todos os estratos do povo de Deus, homens e mulheres, na condução dos caminhos da Igreja o tumor causador desta enfermidade perdurará. Diz-se que Bento XVI passará a todos os Cardeais o referido relatório para cada um saber que problemas irá enfrentar caso seja eleito Papa. E a urgência que terá de introduzir radicais transformações. Desde o tempo da Reforma que se ouve o grito: ”reforma na Cabeça e nos membros”. Porque nunca aconteceu, surgiu  a Reforma como gesto desesperado dos reformadores de fazerem por própria conta tal empreendimento.

Para ilustração dos cristãos e dos interessados em assuntos eclesiásticos, voltemos à questão dos escândalos. A intenção é desdramatizá-los, permitir que se tenha uma noção menos idealista e, por vezes, idolátrica da hierarquia e da figura do Papa e libertar a liberdade para a qual Cristo nos chamou (Galatas 5,1). Nisso não vai nenhum gosto pelo Negativo nem vontade de acrescentar desmoralização sobre desmoralização. O cristão tem que ser adulto, não pode se deixar infantilizar nem permitir que lhe neguem conhecimentos em teologia e em história para dar-se conta de quão humana e demasiadamente humana pode ser a instituição que nos vem dos Apóstolos.

Há uma longa tradição teológica que se refere à Igreja como casta meretriz,  tema abordado detalhadamente por um grande teólogo, amigo do atual Papa, Hans Urs von Balthasar (ver em Sponsa Verbi,  Einsiedeln 1971, 203-305). Em várias ocasiões o teólogo J. Ratzinger se reportou a esta denominação. A Igreja é uma meretriz que toda noite se entrega à prostituição; é casta  porque Cristo, cada manhã se compadece dela, a lava e a ama.

O  habitus meretrius da instituição, o vício do meretrício, foi duramente criticado pelos Santos Padres da Igreja como Santo Ambrósio, Santo Agostinho, São Jerônimo e outros. São Pedro Damião chega a chamar o referido Gregório VII de “Santo Satanás” (D. Romag, Compêndio da história da Igreja, vol 2, Petrópolis 1950,p.112). Essa denominação dura nos remete àquela de Cristo dirigida a Pedro. Por causa de sua profissão de fé o chama “de pedra”mas por causa de sua pouca fé e de não entender os desígnios de Deus o qualificou de “Satanás”(Evangelho de Mateus 16,23). São Paulo parece um moderno falando quando diz a seus opositores com fúria: ”oxalá sejam castrados todos os que vos perturbam”(Gálatas 5.12).

Há portanto, lugar para a profecia na Igreja e para a denúncias dos malfeitos que podem ocorrer no meio eclesiástico e também no meio dos fiéis.

Vou referir outro exemplo tirado de um santo querido da maioria dos católicos brasileiros, por sua candura e bondade: Santo Antônio de Pádua. Em seus sermões, famosos na época, não se mostra  nada doce e gentil. Fez vigorosa crítica aos prelados devassos de seu tempo. Diz ele: “os bispos são cachorros sem nenhuma vergonha, porque sua frente tem cara de meretriz e por isso mesmo não querem criar vergonha”(uso a edição crítica em latim publicada em Lisboa em 2 vol em 1895). Isto foi proferido no sermão do quarto domingo depois de Pentecostes ( p. 278). De outra vez,  chama os prelados de “macacos no telhado, presidindo dai o povo de Deus”(op cit  p. 348).  E continua:” o bispo da Igreja é um escravo que pretende reinar, príncipe iniquo, leão que ruge, urso faminto de rapina que espolia o povo pobre”(p.348). Por fim na festa de São Pedro ergue a voz e denuncia:”Veja que Cristo disse três vezes: apascenta e nenhuma vez tosquia e ordenha… Ai daquele que não apascenta nenhuma vez e tosquia e ordena três ou mais vezes…ele é um dragão ao lado da arca do Senhor que não possui mais que aparência e não a verdade”(vol. 2, 918).

O teólogo Joseph Ratzinger explica o sentido deste tipo de denúncias proféticas:” O sentido da profecia reside, na verdade, menos em algumas predições do que no protesto profético: protesto contra a auto-satisfação das instituições, auto-satisfação que substitui a moral pelo rito e a conversão pelas cerimônias” (Das neue Volk Gottes,  Düsseldorf 1969, p. 250, existe tradução português).

Ratzinger critica com ênfase a separação que fizemos com referencia à figura de Pedro: antes da Páscoa, o traidor; depois de Pentecostes, o fiel. “Pedro continua vivendo esta tensão do antes e do depois; ele continua sendo as duas coisas: a pedra e o escândalo… Não aconteceu, ao largo de toda a história da Igreja, que o Papa, simultaneamente, foi o sucessor de Pedro, a “pedra” e o “escândalo”(p. 259)?

Aonde queremos chegar com tudo isso? Queremos chegar ao reconhecimento de que a igreja- instituição de papas, bispos e padres, é feita de homens que podem trair, negar e fazer do poder religioso negócio e instrumento de autosatisfação. Tal reconhecimento é terapêutico, pois nos cura de toda uma ideologia idolátrica ao redor da figura do Papa, tido como praticamente infalível. Isso é visível em setores conservadores e fundamentalista de movimentos católicos leigos e também de grupos  de padres. Em alguns vigora uma verdadeira papolatria que Bento XVI procurou sempre evitar.

A crise atual da Igreja  provocou a renúncia de um Papa que se deu conta de que não tinha mais o vigor necessário para sanar escândalos de tal gravidade. “Jogou a toalha” com humildade. Que outro mais jovem venha a assuma a tarefa árdua e dura de limpar a corrupção da cúria romana e do universo dos pedófilos, eventualmente puna, deponha e envie alguns mais renitentes para algum convento para fazer penitência e se emendar de vida.

Só quem ama a Igreja pode fazer-lhe as críticas que lhe fizemos, citando textos de autoridade clássicas do passado. Quem deixou de amar a pessoa um dia amada, se torna indiferente à sua vida e destino. Nós nos interessamos à semelhança do amigo e  de irmão de tribulação Hans Küng, (foi condenado pela ex-Inquisição) talvez um dos teólogos  que mais ama a Igreja e por isso a critica.          

Não queremos que cristãos cultivem este sentimento de  de descaso e de indiferença. Por piores que tenham sido seus erros e equívocos históricos, a instituição-Igreja guarda a memória sagrada de Jesus e a gramática dos evangelhos. Ela prega libertação, sabendo que geralmente são outros que libertam e não ela.

Mesmo assim vale estar dentro dela, como estavam São Francisco, Dom Helder Câmara, João XXIII e os notáveis teólogos que ajudaram a fazer o Concílio Vaticano II e que antes haviam sido todos condenados pela ex-Inquisição, como De Lubac, Chenu, Congar,  Rahner e outros. Cumpre  ajuda-la a sair deste embaraço, alimentando-nos mais do sonho de Jesus de um Reino de justiça, de paz e de reconciliação com Deu e do seguimento de sua causa e destino do que de simples e justificada indignação que pode cair facilmente no farisaísmo e no moralismo. 

Por Leonardo Boff