sexta-feira, 30 de outubro de 2009

A questão da certeza no agnosticismo


A questão da certeza no agnosticismo

Enéias Teles Borges

Partindo duma premissa interessante do agnosticismo, que se finca na convicção de que é impossível provar ou negar a existência de deus, servindo-se dos meios humanos, eu me pergunto: Como se faz, então, a opção pelo teísmo ou pelo ateísmo? Claro que proponho a questão olhando pela perspectiva de um agnóstico...

Questão de escolha, sim, meramente de escolha. Um agnóstico pode, mesmo afirmando ser impossível provar ou negar a existência de deus, escolher ser criacionista ou ateu. Quando perguntado sobre o motivo de uma escolha ou outra, a resposta seria simples: “mesmo tendo a convicção de que é impossível provar ou negar a existência de tal divindade, por questão pessoal (e afins), escolhi ser assim ou assado...”

Muitos, quem sabe, surpreender-se-ão com isso. Imaginam que se um indivíduo não é ateu ou criacionista ele, por exclusão, é agnóstico. Já tratamos por aqui esse ponto. O agnosticismo não é o meio termo entre teístas e ateístas. Ponto final!

É possível, portanto, existir agnóstico ateu e agnóstico teísta e mais, dentro do teísmo é possível encontrar um agnóstico deísta.

Qual é, então, a diferença entre um agnóstico criacionista e um criacionista “normal”? Tomando como exemplo apenas o cristianismo, podemos afirmar que um criacionista “normal” aceita os fatos bíblicos como sendo verdadeiros. Exemplificando: o dilúvio. O agnóstico criacionista, por acreditar ser impossível provar ou negar a existência de deus, tende a não aceitar o dilúvio da forma como exarada na bíblia. Como seria possível acreditar nas informações dadas no livro milenar, como sendo a palavra expressa de deus, se ele, agnóstico, não vê prova de existência do poderoso ser?

Não é tão simples assim a questão da certeza em face do agnosticismo criacionista. E não poderia ser diferente. O criacionista “normal” não tem semelhança prática com o agnóstico criacionista, assim como não há similaridade prática entre o ateu convicto e o agnóstico ateu.

Voltaremos ao tema.
-

domingo, 25 de outubro de 2009

A guerra dos meninos


Nos anos 1980 eu estava estudando no IAE (Instituto Adventista de Ensino) atual UNASP (Centro Universitário Adventista – SP). Houve um momento, entre o final do segundo grau e início da faculdade de teologia, em que me foi possível vivenciar um alvoroço no arraial. De repente um assunto tomou conta do meio: mensagens subliminares captadas ouvindo discos, girando-os em sentido contrário. Supostamente era possível ouvir mensagens satânicas quando algumas músicas eram ouvidas “ao contrário”. Eram muitos músicos estrangeiros, mas havia, também, alguns brasileiros. Destaques para Raul Seixas e Zé Ramalho.

Era uma loucura! Os pais, preocupados, lotavam o salão nobre da instituição. Eram noites de reavivamento espiritual. Precisavam convencer os filhos acerca da nocividade das músicas populares. Foi uma agitação maior do que outra, mais atual, promovida pelos livros e filmes de Harry Potter e pelo livro e filme “O Código da Vinci”.

Lembro-me claramente que uma música especial foi destaque. Justamente uma do cantor Roberto Carlos, do seu LP de 1980, cujo título é “a guerra dos meninos”. Trata-se de composição que fala de um sonho e neste sonho o cantor diz que foi o mais bonito de sua vida. Tem uma frase que despertou a atenção dos “analistas” que é a seguinte: “quando em minha porta alguém tocou, sem que ela se abrisse ele entrou..”

Esta frase causou comoção pois os ditos analistas asseveravam que somente uma força espiritual (no caso - maligna) poderia passar por uma porta não aberta. Tal força espiritual, claro, era do senhor das trevas. O interessante é que se desconsiderava o fato de que o cantor estava, desde o começo, referindo-se a um sonho. Sonho que tratava de paz vinda por meio de crianças? Não se sabe o motivo real da implicação profunda contra esta música em especial.

Não importa! A música foi ouvida ao contrário e os “analistas” separaram uma frase parecida com isso: “...e esse diabo vai cantar de novo...”

Pronto: a música tornou-se maldita! Professores do seminário de teologia foram convocados e muita coisa se disse e se ouviu a respeito de mensagens satânicas subliminares inseridas em músicas populares.

Não faz muito tempo lembrei-me desse episódio ocorrido há mais de 25 anos, e procurei saber o que tinha se passado com aqueles analistas, paraninfos da boa música. Soube que muitos tinham deixado esse assunto de lado. Havia sido um momento fugaz. Alguns até se sentiam envergonhados pelo alvoroço que promoveram e outros ainda seguem acreditando naquilo tudo, mas sem promover qualquer tipo de algaravia.

Eu soube, também, que eles andaram ouvindo “ao contrário” algumas músicas evangélicas, incluindo as dos adventistas, e ouviram frases parecidas com aquelas de músicas seculares. Ficaram com grande dúvida: se aquelas eram “do mal” como explicar as mensagens nas supostas músicas “do bem”?

Discussões à parte eu quero fazer um chamamento à reflexão. Nem sei se reflexão ou se um chamado ao “varandão da saudade”. Que tal ouvir a música, prestar atenção na letra e, quem sabe, emitir sua opinião?

Seria possível mesmo tudo aquilo que disseram da música? Que encerrava em si uma apologia ao mal? A música trata de “um bem maior”: a paz, o amor e deus... (claro que naquele tempo dizia-se que essa paz era uma paz falsa, advinda do mal ou uma forma de “contrafação”...) Sugiro que seja ouvida com calma e que a letra seja analisada de forma imparcial.

Eis o link para a música [a guerra dos meninos].

Enéias Teles Borges

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O agnóstico é um desnorteado?

Segundo a análise de muitos, os teístas e os ateístas são indivíduos que, a despeito do contraste de suas convicções, podem ser considerados entes de norte definido. Por norte definido entende-se o oposto de desnorteado, que é o que perdeu o rumo ou sentido de direção que é confuso ou embaraçado. Tal entendimento, no que diz respeito a crer ou não crer na existência de divindades, faz do cidadão um ser convicto ou não, desnorteado ou não. Em suma diríamos que tanto o teísta quanto o ateísta são pessoas com seu rumo bem delineado, mesmo tendo convicções contrastantes.

O que dizer, então, de um agnóstico? Seria, portanto, um desnorteado por não partilhar rigorosamente de uma convicção (teísta ou ateísta)? Somente serão considerados com sentido de direção aqueles que se alinham com o teísmo ou ateísmo? Haveria uma terceira via? Essa outra via seria o agnosticismo?

É bom entender que para o agnóstico, assim como não é possível provar, de forma racional, a existência de divindades e do sobrenatural, é de igual maneira impossível provar que não existem. É claro que o agnóstico não considera isso um problema, já que ele não enxerga necessidade que o force a se enveredar por essa tarefa investigativa e estéril (divindades existem ou não existem?).

“Muitas pessoas usam, erroneamente, a palavra agnosticismo com o sentido de um meio-termo entre teísmo e ateísmo. Isso é estritamente incorreto pois teísmo e ateísmo separam aqueles que acreditam num Deus daqueles que não acreditam. O agnosticismo separa aqueles que acreditam que a razão não pode penetrar o reino do sobrenatural daqueles que defendem a capacidade da razão de afirmar ou negar a veracidade da crença teística”. (Wikipedia).

Ao definir que a razão não pode penetrar o reino sobrenatural o agnóstico mostra o seu norte e não se perturba com isso. Quem poderia, com o pleno uso da razão, afirmar que ele (agnóstico) está errado por assim proceder?

A maneira como o agnostismo pode melhor ser enxergada encontra guarida no seguinte: agnosticismo é uma forma mais intelectualmente honesta de ver a questão da existência ou não de um ser superior. Enquanto o ateísmo afirma que Deus não existe, numa posição que não pode ser provada, o agnosticismo argumenta que a existência de Deus não pode ser provada ou deixar de ser provada; que é impossível saber se Deus existe ou não. Neste conceito, o agnosticismo está certo. A existência de Deus não pode ser provada ou deixar de ser provada empiricamente.

O assim pensar é típico de um desnorteado ou de quem é honesto, compromissado e pronto para aceitar evidências de um lado ou de outro (caso existam)?

Enéias Teles Borges

sábado, 3 de outubro de 2009

Sobre a ética e a moralidade...


Uma missão difícil eu creio que está concluída. Foi a de mostrar às minhas filhas que a boa ética e sã moral independem de religiosidade ou, melhor dizendo, da cultura religiosa. O contexto no qual cresceram e estudaram tem imensa dificuldade para mostrar que é possível ser ateu e ainda assim ser ético e ter moralidade. Assim como existem pessoas boas é más nos centros de fé o mesmo ocorre nos âmbitos daqueles que creem na inexistência de qualquer divindade. Isto que dizer que elas, sendo teístas ou ateístas, estão obrigadas a enxergar esta vertente pura da ética e da moralidade.

Devo admitir que foi uma tarefa árdua. Cresci aprendendo que ser religioso é ser ético e não ter deus no coração é ser louco. Não é um provérbio bem difundido aquele que assevera ser néscio o que afirma não existir deus? Por suposta loucura há um encaixe: o ateu não é ético, logo o ateu conspira contra a moralidade. Algo como um mundo sem limites às mazelas da carne – promovido pelos loucos ateus. Não é isso que, enfim, fica transparente no discurso dos pseudo-religiosos?

Concluo, portanto, que a missão está cumprida e não é de hoje. Até considero minhas filhas como privilegiadas por não terem ouvido desde a infância “que eram filhas da luz” e que fora do contexto de fé no qual cresceram só existem os “filhos e filhas das trevas”.

Neste sábado tecemos comentários acerca da dissociação que há entre ética e religiosidade. Existem éticos em todos os lugares e isso independe de sexo, cor, religião e afins. Eu as ouvi falando longamente sobre isso. Foi gratificante não ver nelas os assustadores indícios da crença espúria: aquela que sugere que só o religioso é bom e, em contrapartida, o não religioso carece de freios morais.

Sinto-me aliviado pois sempre sofri pressão dos “meus iguais” que seguem habitando no centro de cultura religiosa. Quantas vezes eu ouvi algo como “é preciso manter suas crianças sempre na igreja para que aprendam o que é certo e saibam se afastar do que não é justo”. Ou assim: “você tem se ausentado da igreja. Você é adulto, mas sua atitude é prejudicial às suas filhas que necessitam frequentar a igreja...”

Não foi fácil ao longo dos 19 anos de uma filha acrescidos dos 16 anos paralelos da outra. Como é importante ver que entenderam que a ética e a moralidade são qualidades que precisam ser bem desenvolvidas e que para tal não são necessários o incentivo e o chicote dos centros de difusão da fé cega e da faca amolada.

Elas compreendem, é claro, que o ambiente dos centros de cultura religiosa é bom. Repleto de pessoas bem intencionadas, mas que carecem de uma visão mais clara e respeitosa acerca das demais pessoas de outras religiões e das que sequer têm religião - por serem atéias.

Sinto-me, no mês em que completei 47 anos, realizado no que concerne a este ponto importante, independentemente de religiosidade ou ausência dela: deve-se fazer o certo simplesmente porque é certo. Eis o que se pode dizer de ética e de moralidade. Eis o que me deixa com a convicção de que minhas filhas entenderam...

Enéias Teles Borges