quarta-feira, 14 de abril de 2010

Religiosidade e cultura religiosa

Tenho detectado resistência de muitos, quando diferencio religião de cultura religiosa. Produzi um texto com esse tema (Religião ou Cultura Religiosa?). Recomendo a leitura daquela postagem que será incrementada com o que digitarei adiante.

Para entender religião, em especial o Cristianismo, precisaremos nos ater a três verbos: garantir, acreditar e doutrinar.

Uma religião ou segmento religioso precisa GARANTIR a salvação aos fiéis. O objetivo principal da membresia é, de fato, a salvação ou, em outras palavras, a migração desse mundo finito e tenebroso para o mundo eterno e maravilhoso. A religião, portanto, garante aos fiéis a salvação e tal salvação remete ao segundo verbo.

Uma religião ou segmento religioso precisa ACREDITAR naquilo que difunde. Estamos falando de um credo. Cada grupo religioso tem um credo diferenciado e é nessa divergência de credos que encontramos a explicação para o número imenso de segmentos que se arvoram à condição de únicos portadores da “verdade verdadeira”. A religião, evidentemente, GARANTE a salvação, mas é necessário que se ACREDITE no credo proposto. O credo é o caminho para a graça, que no caso do Cristianismo é oriunda de Jesus e dos seus méritos (justiça imputada). Do exercício dos dois verbos, garantir e acreditar, nós somos remetidos ao terceiro verbo.

Uma religião ou segmento religioso, que GARANTE e que ACREDITA, não pode guardar apenas para seus membros as “boas novas de salvação”. Não basta garantir a salvação aos que acreditam. Novos prosélitos precisam ser captados. O verdadeiro fiel religioso GARANTE, ACREDITA e DOUTRINA. A membresia convicta da garantia da salvação, por acreditar no credo, vê-se impelida a doutrinar. Chamam o doutrinamento de obras da fé (frutos do espírito ou o realizar de Cristo nos atos humanos – isso no Cristianismo). É o trabalho incessante do que tem a garantia da salvação, por acreditar na mensagem que abraçou e que se sente no dever de doutrinar aqueles (muitos) que “estão nas trevas”. Todo aquele que não compartilha do credo é ser humano que precisa ser resgatado do “império da maldade”.

Depois do entendimento do que é religião (na prática), entendimento esse que compreende a convicção e o conhecimento do credo e de tudo o mais que a tradição daquele contexto religioso produziu, é possível, facilmente, diferenciar “religião” de “cultura religiosa”. Como? De forma bem simples: acima ficou claro como funciona a prática no mundo da religião. Na cultura religiosa não é possível conjugar de forma eficiente aqueles três verbos. Melhor dizendo: não é possível viver tais verbos. O religioso crê porque conhece e por conhecer é que garante a salvação. Por conhecer e crer no credo difunde, de forma consistente, a história do seu segmento religioso (a começar da criação humana até a glorificação no outro mundo – aquele mundo eterno).

O que possui tão somente a cultura religiosa não garante, porque não conhece o credo e por não conhecer o credo, como seria possível doutrinar? Em resumo o que se pode dizer é cristalino e, portanto, de fácil entendimento. O religioso é um convicto, pois sua crença está sedimentada no conhecimento e na fé que advém de tal conhecimento. Aquele que possui a cultura religiosa é um alienado, que só está ali por circunstâncias da vida. Está ali porque foi colocado. Nunca entrou, pois sempre esteve ou, melhor dizendo, nasceu no contexto. Nada pesquisou, nada sabe. Porta-se como papagaio da fé que segue, a vida inteira, difundindo, de forma fugaz, uma luz que imagina possuir.

É claro que um ferrenho seguidor da cultura religiosa poderá se transformar num ferrenho religioso. Basta que ele entenda (na essência) os verbos garantir, acreditar e doutrinar.

Enéias Teles Borges

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