quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Fé: Indústria e Comércio

A postagem a seguir é resultante da somatória de três textos oriundos do blogue Convictos ou Alienados?, no ano de 2009.

Fé: Indústria e Comércio - I

A fé pode ser industrializada e depois comercializada? Muitos entendem que não. No mundo atual a difusão da fé tem crescido de forma absurda! São tantos, os aglomerados da fé, que é necessário um estudo pormenorizado de cada segmento para saber que tipo de produto está sendo oferecido à membresia. Como são formados os credos? Como são treinados os líderes? Como a doutrina precisa ser incutida? Como ter um diferencial para atrair adeptos?

A religião central do nosso enfoque é o cristianismo. Por hora apenas nele nos concentraremos. Por que o Brasil tem tantas igrejas e seitas? Quais os ingredientes do cardápio doutrinário de cada agremiação religiosa? Qual a maneira inteligente criada pelos núcleos para levar o fiel a acreditar que somente a sua agremiação tem a verdade?

Fé: Indústria e Comércio - II

O início de um movimento é suscitado pela crença ou pela esperteza. Com o passar do tempo a agremiação ganha corpo físico e corpo doutrinário. As doutrinas são incorporadas na medida em que os intelectuais do meio começam a apresentar teses de onde vieram (ou teses adaptadas). Nada se cria, tudo se copia e modifica. Com a explosão demográfica na instituição de fé outros mecanismos vão surgindo. Há necessidade de diversificação: mídia (TV e rádio), hospitais, educação e afins. O movimento transforma-se num conglomerado que junta bens e fiéis. Observem que acontece esse tipo de crescimento em todas. Todas mesmo!

Precisam surgir diferenciais. Por que ficar nesta e não naquela? A indústria da fé precisa agir com inteligência. Será necessário comercializar a produção de tal forma a levar o fiel a crer que está no único lugar correto. A produção de costumes na indústria da fé tem que ser na medida exata. Remédio em pequena quantidade produz dispersão e remédio em quantidade excessiva aniquila o paciente. Surgem os seminários que produzirão gerentes de ordens: pastores, bispos, padres, não importa o título. Os gerentes são os principais comerciantes no varejo da fé. Precisam ensinar a membresia a vender e atrair mais compradores que se tornarão vendedores... O que se vende? Uma teoria de fé cumulada com práticas específicas. A medida exata da difusão dos costumes e da doutrina levará o membro a se julgar um felizardo por estar no lugar certo.

Não existe outra forma de industrializar e comercializar. Não havendo um equilíbrio nos costumes e nas doutrinas a difusão dos produtos não trará os resultados ideais. Iniciar um projeto e não concluir propiciará uma debandada para outro conglomerado. Nos tempos atuais as instituições de fé estão em luta acirrada. Muitos produtos para poucos consumidores. Incentivos são instituídos e colocados nas mãos dos gerentes de ordem.

Na indústria e comércio da fé existem três tipos de indivíduos essenciais: os pensadores, os difusores e os absorvedores...
 
Fé: Indústria e Comércio - III
 
Na indústria e comércio da fé existem três tipos de indivíduos essenciais: os pensadores, os difusores e os absorvedores.

Os pensadores conduzem a indústria religiosa por meio da implementação da “teologia sistematizada”. Esta teologia precisa ficar entre muros e será modificada de forma gradual, de maneira a atravessar gerações. Uma visualização cautelosa da teologia sistemática de uma agremiação permitirá notar a diferença gritante entre o pensamento dos primeiros teólogos, quando comparado com o pensamento dos atuais. Esta adequação recebe várias expressões designativas tais como “adaptação ao momento histórico”, “revelação progressiva”, “repúdio à inspiração estática” e afins. É grandioso o trabalho executado pelos pensadores que são lotados em seminários, editoras, pontos estratégicos de elaboração e difusão. Eles dão o tom exato do conglomerado da fé, sempre atentos ao que acontece no mundo. A cultura religiosa não existiria sem eles.

Os difusores assumem a função de levar à mesa o alimento idealizado pelos pensadores. Função essencial pois sem este intermediário da fé as elucubrações dos pensadores não chegariam aos agentes de consumo (absorvedores). Os difusores dotados de senso crítico acurado são elevados à condição de pensadores ou sumariamente afastados. Difusor que pensa e questiona é promovido ou demitido. Não há possibilidade de um difusor que pense cumprir o papel de distribuir cardápios e pratos. O difusor bem preparado é o grande gerente (padre, pastor, bispo e leigo de alto conceito) que faz implementação da teologia sistemática criada e sempre adaptada pelos pensadores. É um trabalho hercúleo! Os difusores precisam crer piamente no que ensinam ou pelo menos fingir com eficácia. É irrelevante se o difusor seja crédulo ou incrédulo: o mister tem que ser cumprido rigorosamente conforme ditames dos pensadores. A cultura religiosa não seria difundida sem eles.

Os absorvedores são os alvos a serem alcançados. Não existiriam agremiações compostas apenas por pensadores e difusores. Faltaria o objeto principal para consumir os produtos industrializados e comercializados. A fé sem membresia não existe. A fé sem pessoas para seu efetivo exercício é figura inimaginável! Os absorvedores precisam ser tratados como ovelhas mansas e essencialmente crédulas. Não existe absorvedor questionador. O questionador é excluído do meio. Sua sagacidade não lhe permitiria ser um difusor. Não é permitido dar o grande salto! Impossível saltar do ofício de absorvedor para pensador. A função do absorvedor é consumir! Jamais produzir! Nunca comercializar! A cultura religiosa não seria consumida sem eles.

Fé: indústria e comércio. Simplesmente isto. Uma grande empresa elaborada (pensadores), apresentada (difusores) e amada (absorvedores). Eis um fato que poucos ousam admitir e que muitos insistem em não enxergar...

(Convictos ou Alienados?)
 
Enéias Teles Borges - Bacharel em Teologia e Advogado
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