Saudades de minha inocência
Enéias Teles Borges
Houve um período, em minha vida, que deve ser considerado tempo de inocência. Eu acreditava no que me diziam com muita facilidade. A ausência de malícia não me tornava um bitolado (não me fechava para novas ideias). Eu acreditava porque era razoável crer. Por que não acreditar no que me diziam, se eu cria na bondade e na capacidade das pessoas em minha volta? O pressuposto era bem simples: os seres do bem, disseminam coisas do bem. Ponto! Eu confiava nas pessoas e, por nelas confiar, eu acreditava em tudo o que diziam.
As lições, que a vida me trouxe, ensinaram-me a confiar desconfiando. Mesmo confiando nos indivíduos não seria possível acreditar, sempre, no que eles diziam. Eles até poderiam agir com boas intenções, mas isso não queria dizer que estivessem certos, simplesmente porque eram confiáveis. A vida ficou amara. Passei a ter um permanente “nó na garganta”. Percebi que as pessoas quase sempre não mereciam confiança. E mais: mesmo quando confiáveis, nem sempre se serviam de fontes fidedignas, quando difundiam suas convicções. Não é fácil! Acreditar faz bem, mas nem sempre aquilo que parece bom o é, em sua essência. Por essa e por outras, eu concluí, que é impossível viver, hoje, sem sentir saudades dos tempos de inocência.
Depois de tudo isso as paisagens da vida continuaram as mesmas, mas já não eram vistas com os mesmos olhos (os saudosos olhos da inocência). Alguém poderia dizer: “faz parte do amadurecimento humano. Você pensava como menino e, agora que cresceu, deixou de pensar como menino...” Parece simples, mas não é bem assim. Seria até bom se assim fosse, mas por que eu haveria de me enganar? A expressão saudades da inocência tem um sentido figurado: é o de sentir saudades de um tempo em que era normal confiar sem questionar. Nos “tempos de hoje” é imperdoável, confiar sem questionar. A realidade não permite mais isso. Urge acordar! Não estamos mais nos anos dourados. Não vivemos mais na “ilha da fantasia”. Moramos no terrível mundo do “aqui” e do “agora”. Só nos resta sentir saudades da nossa inocência e ponto final! O mundo real não nos permite realizar sonhos! Não existe o mundo ideal! Esse suposto mundo ideal só há para quem está disposto a acreditar na existência de Papai Noel, do Saci Pererê, de Duendes e afins. Serve sim e, de forma cabal, para os eternos detentores da fé cega e da faca amolada. Para os que querem abrir os olhos para enxergar (ver de verdade) só resta sentir saudades do tempo de inocência. É como sentir saudades de um mundo no qual nunca se viveu...
A grande realidade é essa: quem passa grande parte da vida acreditando que existe um pote de ouro no fim do arco-íris e depois descobre que tal tesouro não existe, tende a suspirar e aceitar a realidade. Aceitando essa realidade, haverá de sentir saudades do tempo no qual ainda não tinha constatado que, no fim do arco-íris, não existe pote de ouro. E mais: nunca existiu! Pois é assim mesmo: depois que constatei que não existe um pote de ouro no fim do arco-íris (por favor – isso é sentido figurado), comecei, desesperadamente a sentir saudades de minha inocência...
-
Nenhum comentário:
Postar um comentário